sábado, 20 de agosto de 2011

Legítima defesa putativa

Questão: Astrogildo está na sala de sua casa assistindo televisão, quando seu amigo entra em casa pela porta dos fundos. Astrogildo, pensando ser um assaltante, efetua três disparos de arma de fogo contra a pessoa, certo de que está praticando uma ação amparada por legítima defesa. Astrogildo responderá por crime?
Como defensor do Astrogildo, recorro a tese da legítima defesa putativa, ou seja, “assim age quem, para defender sua casa, faz disparo contra pessoa que supõe ser ladrão (TACrSP, Julgados 87/190; TJSP, RF 265/354; TJRO, RT 715/506).” (DELMANTO, 2007)
No caso narrado, Astrogildo, pensando tratar-se de um assaltante, desencadeou uma reação humana, supondo estar agindo em legítima defesa. Nesse sentido, frisa-se que a reação humana não pode ser medida com um transferidor, milimetricamente ou com matemática proporcionalidade, por se tratar de um ato instintivo, escreve DELMANTO. Assim, Astrogildo supôs, mesmo que erradamente, que estava agindo em legítima defesa diante de uma condição de fato que o motivou a praticar a excepcional conduta. Vale lembrar, que a legítima defesa putativa, associa-se as descriminantes putativas elencadas no §1º, do art. 20, do CP.
O referido dispositivo legal (§1º, do art. 20, do CP ) isenta de pena quem, por erro plenamente justificável, supõe situação de fato que, se ela existisse, tornaria a ação legítima. Explica DELMANTO que, “por erro plenamente justificável pelas circunstâncias, supõe estar agindo de acordo com uma dessas causas que excluem a ilicitude.” E no caso, Astrogildo agiu certo de que estava praticando uma ação amparada pela legítima defesa.
Importa frisar que, considera-se crime o fato típico, antijurídico e culpável. No caso em tela, tem-se um fato típico (art. 121, CP – matar alguém), é culpável. Contudo há uma das causas de excludentes de ilicitude que acaba afastando a antijuridicidade. Ora, deixando de existir um desses elementos (fato típico, antijurídico e culpável) não há que se falar em crime.   
Diante disso, utilizando-se da teoria finalista que define crime como sendo um fato típico, antijurídico e culpável, entendo que Astrogildo não merece responder por crime de homicídio no caso narrado, pois está-se frente a uma excludente de ilicitude prevista em lei (art. 25 c/c o §1º, do art. 20, ambos do Código Penal).  Quando muito, este deverá responder pelo crime de disparo de arma de fogo, uma vez preenchida a tipificação exarada no art. 15, da lei 10.826/2003.
Esse é meu entendimento, salvo melhor juízo.
Blumenau, 20 de agosto de 2011.
Jelson Styburski

sábado, 13 de agosto de 2011

É cabível a interpretação analógica no Direito Penal?

Sim. A interpretação analógica é possível no Direito Penal.
A confusão reside na terminologia das palavras. Explico. Para Celso Delmanto, a expressão 'interpretação analógica' vem sendo utilizada de maneira equivocada, pois os métodos de interpretação da norma legal são: gramatical, lógico, sistemático, histórico, teleológico, sociológico. Desses métodos de interpretação pode-se obter resultados de forma declarativa, restritiva e extensiva. Por isso, o ideal é a utilização da expressão 'interpretação [...] com efeitos extensivos'.
Essa interpretação ocorre quando existe uma norma legal, porém que não esclarece todas as situações que estão abrangidas na tipificação. Exemplo: o art. 171, do CP, tipifica o crime de estelionato como aquele em que o indivíduo obtem para si ou para outrem vantagem ilícita, em pejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante  artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento. A expressão 'qualquer outro meio fraudulento" não esclarece quais são esses 'meios' a que o legislador se referiu. Faz-se necessário a utilização de um dos métodos de interpretação com efeito extensivo para complementar o que o legislador disse de menos.
Já a analogia é aplicada quando existe uma lacuna na lei, ou seja, uma hipótese que não se encontra prevista em nenhum dispositivo legal. Nesse caso, o art. 4º, da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, prevê a possibilidade do uso da analogia. Entretanto, para o Direito Penal, em respeito ao princípio da legalidade ou princípio da reserva legal, não há crime sem lei que o preveja. Desta forma, é vedado o uso da analogia para tipificar condutas incriminadoras. Contudo, pode-se fazer uso da analogia para favorecer a liberdade da pessoa (princípio geral de direito do favor libertatis). Essa é a conhecida analogia in bonam partem.
No HC 48228/PB o STJ entendeu que "a lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito." Essa possibilidade vem descrita no art. 3º, do CPP.
Enfim, a interpretação com efeitos extensivos é possível quando da incompletude de um texto de norma  legal, utilize-se de uma formúla genérica, que interpretará de acordo com casos anterios. Enquanto que a analogia é aplicável nos casos de lacuna da lei, ou seja, não existe nenhuma norma regulando o assunto. Esse é meu entendimento, salvo melhor juízo.