quarta-feira, 18 de agosto de 2010

DIREITO DAS COISAS - DA SUPERFÍCIE

PARECER TÉCNICO JURÍDICO (trabalho de faculdade).

DIREITO CIVIL. DIREITO DE SUPERFÍCIE. CONFLITO DE TEMPO. PRAZO DETERMINADO OU PRAZO INDETERMINADO. PRINCÍPIO DA LEI POSTERIOR.
1. Conforme art. 2º, §1º da LICC, lei posterior revoga a lei anterior.
2. O Enunciado 249 reforça a idéia trazida pelo Código Civil de que o tempo para o direito de superfície é determinado.

Relatório

Surgiu um questionamento interessante em relação ao tempo previsto para o direito de superfície. O art. 1.369 do Código Civil estabelece tempo determinado para concessão do direito de construir ou plantar em solo alheio. Já o art. 21 da Lei 10.257/2001 (Estatuto da Cidade) prevê tanto o tempo determinado como o tempo indeterminado. De início, se visualizou uma solução fácil, pois o Código Civil foi publicado em 10.01.2002 e a Lei 10.257/2001 em 10.07.2001. Desta forma, lei posterior revoga a lei anterior no que for contrária. Nesse sentido deveria prevalecer o disposto no art. 1.369 do Código Civil. Entretanto, surge o Enunciado 93 da Jornada de Direito Civil do Conselho de Justiça Federal, realizado de 11 a 13.09.2002. Nesse enunciado, para complicar com o ordenamento jurídico, foi estabelecido que as normas do Código Civil sobre direito de superfície não revogam as relativas do Estatuto da Cidade.
E agora, o direito de superfície é por tempo determinado ou indeterminado?
Diante do exposto, passa-se à exposição do parecer.

Considerações Preliminares

Ab initio, no intuito de melhor esclarecer a matéria, impende transcrever os dispositivos em comento:

Art. 1.369 do CC – o proprietário pode conceder a outrem o direito de construir ou plantar em seu terreno, por tempo determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis.
Art. 21 da Lei 10.257/2001 - O proprietário urbano poderá conceder a outrem o direito de superfície do seu terreno, por tempo determinado ou indeterminado, mediante escritura pública registrada no cartório de registro de imóveis.

Enunciado 93 – Jornada de Direito Civil – Conselho da Justiça Federal – “as normas previstas no CC sobre direito de superfície não revogam as relativas a direito de superfície constantes no Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001) por ser instrumento de política de desenvolvimento urbano.”

Nota-se que o tema é complexo e demandaria um estudo bem mais aprofundado. Contudo, o objetivo aqui é, resumidamente, trazer uma opinião acadêmica sobre a matéria. Com isso, sendo o mais objetivo possível, darei minha posição em relação ao tempo em ser determinado ou indeterminado no direito de superfície.
Inicialmente, é bom lembrar que o parágrafo primeiro do art. 2º da Lei de Introdução ao Código Civil (LICC) traz expressamente que a lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior. Para alguns, tal dispositivo confirma o princípio da lei posterior.
Também é importante frisar, que no ordenamento jurídico existe uma hierarquia de leis, onde uma lei superior prevalece sobe uma lei de hierarquia inferior. Por fim, tem-se o critério da especialidade, onde uma lei especial pode revogar uma lei geral.
No caso em comento, o Código Civil é lei posterior, portanto, revogaria a lei anterior, pois este regula de forma completa a matéria do direito de superfície. Em relação a hierarquia, tanto o Código Civil como a Lei 10.257/2001 são leis ordinárias, mesma hierarquia. Porém, o Código Civil é norma geral. Penso que normas gerais devem apresentar maior força de aplicabilidade do que as regras específicas, logo, o Código Civil prevalece sobre o Estatuto da cidade. Tem-se ainda, que a lei 10.257/2001 é lei especial, entretanto, isso não quer significar que norma especial revogue a norma geral. Esse seria um primeiro pensamento. Todavia, o Enunciado 93 não pensa assim.
Agora, segundo a doutrina pesquisada, Francisco Eduardo Loureiro, escreve:

“ao contrário de determinados modelos legislativos, o artigo em exame deixa explícito que o direito de superfície é temporário e, mais, por tempo determinado. A regra é cogente, não havendo direito de superfície perpétuo, constituindo fraude à lei a cláusula estabelecendo-o por prazo tão longo que equivalha, em seus efeitos, à perpetuidade
[1].”

Ou seja, o art. 1.369 do Código Civil impõe o tempo determinado para vigência do direito de superfície. Por isso, em sintonia com o pensamento do doutrinador exposto acima, vale a pena destacar outro Enunciado. Enunciado que também foi firmado posteriormente ao Enunciado 93. Trata-se do Enunciado 249 da III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal realizado nos dias 02 e 03.12.2004. Transcreve-se:

Enunciado 249 – III Jornada de Direito Civil – Conselho da Justiça Federal – “a propriedade superficiária pode ser autonomamente objeto de direitos reais de gozo e de garantia, cujo o prazo não exceda a duração da concessão da superfície, não se lhe aplicando o art. 1.474.”

Ora, claramente dispõem o Enunciado uma duração de tempo ao direito de propriedade superficiária, ou seja, esse direito não pode exceder a um prazo de duração, logo, entende-se que o direito de superfície não deve ser perpétuo, sendo assim, possui tempo determinado.
Além do mais, o Enunciado 93 é de 2002 e o Enunciado 249 é de 2004. Mais uma vez, analogicamente, o Enunciado posterior prevalece sobre o Enunciado anterior no que conflitar ou reforçar.
Presume-se que o Enunciado 93, ao ser criado, não se atentou ao tempo determinado previsto no Código Civil e ao tempo indeterminado disposto no art. 21 do Estatuto da Cidade. Sua intenção foi garantir que as normas supervenientes do Estatuto da Cidade, por serem normas de interesse local e de desenvolvimento urbano, deveriam permanecer em vigor, já que na época se cogitava revogar tal lei. Por isso, o Enunciado 249, elaborado, praticamente, dois anos mais tarde, veio para dar mais força a idéia do tempo previsto para o direito de superfície, ou melhor, este Enunciado reafirmou a previsão de tempo determinado que o art. 1.369 do Código Civil previa.
Por fim, não se pode esquecer que o direito de superfície é também um negócio jurídico firmado entre duas partes. Sendo assim, o negócio jurídico só se torna válido se tiver um agente capaz, um objeto lícito, possível, determinado ou determinável e acima de tudo, obedecer a forma prescrita ou não defesa em lei. Diante disso, é imprescindível a todo negócio jurídico a observância dos requisitos dispostos na lei, pois uma vez não atendidos tais requisitos, o negócio jurídico torna-se nulo, segundo o art. 166, IV do Código Civil, in verbis:

Art. 166 – é nulo o negócio jurídico quando:
IV – não revestir a forma prescrita em lei.

Conclusão

Ante o exposto, que o tempo previsto para conceder um direito de superfície deva ser determinado, pois não se pode conceder a idéia de um direito perpétuo numa sociedade que evolui. Admitir tal pretensão (tempo indeterminado), é imaginar que nossa sociedade sempre será a mesma, sem progressão. Nesse sentido o direito deve ser um vetor que impulsiona o desenvolvimento e progresso da sociedade, contribuindo para que ela se torne cada vez melhor e mais justa.

Este é o parecer, salvo melhor juízo.

Blumenau (SC), 4 de agosto de 2010.

Jelson Styburski
Parecerista
OAB/SC 8094-E

[1] LOUREIRO, Francisco Eduardo. Código civil comentado: doutrina e jurisprudência. 2º Ed. Ver. e atual. Coordenador Min. Cezar Peluso. São Paulo: Manole, 2009. p 1.384.

RESOLUÇÃO DE ESTUDO DE CASO DIREITO TRIBUTÁRIO

ESTUDO DE CASO n. 1 - DIREITO TRIBUTÁRIO

Trata-se de ação ordinária em face da UNIÃO FEDERAL, objetivando a anulação do ato declaratório de exclusão do SIMPLES, com o reconhecimento do direito de permanecer enquadrada no regime simplificado de tributação.
A autora alega que sua atividade não pode ser confundida com a atividade de “produção de espetáculos”. Afirma que nunca realizou atividade envolvendo a contratação ou apresentação de atores, cantores, artistas ou assemelhados, nunca dependendo de habilitação profissional legalmente exigida.
A UNIÃO, por sua vez, alega que a atividade desenvolvida pela autora embora não tenha previsão específica, deve ser entendida como qualquer atividade de prestação de serviços que tenha similaridade ou semelhança com as enumeradas no inciso XIII do art. 9º da Lei 9.317/96, ou seja que a lista contida no inciso não é exaustiva. Alega que o serviço de organização de feiras e amostras, congressos, seminários, bem como de festas e recepções é assemelhado ao serviço prestado por diretor ou produtor de espetáculos, pois em ambos os casos é o prestador de serviços quem administra todos os elementos necessários à consecução do evento.
Analise o caso e fundamentadamente, se possui a autora ou não, direito a ser enquadrada no SIMPLES.

Resposta:

Resumindo, temos de um lado a autora que é uma empresa que presta serviços de organização de feiras e amostras, congressos, seminários, bem como festas e recepções. Segundo esta, a mesma deve ser enquadrada no SIMPLES em relação à tributação. Para a União Federal, a atividade desenvolvida pela autora, embora não tenha previsão específica, deve ser entendida como as mesmas atividades enumeradas no inciso XIII do art. 9º da Lei 9.317/96 (lei que dispõe sobre o regime tributário das microempresas e das empresas de pequeno porte, institui o Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte - SIMPLES e dá outras providências).

Inicialmente, traz-se o disposto no inciso XIII do art. 9º da Lei 9.317 de 05 de dezembro de 1996, in verbis:

Art. 9º - Não poderá optar pelo SIMPLES, a pessoa jurídica:
XIII - que preste serviços profissionais de corretor, representante comercial, despachante, ator, empresário, diretor ou produtor de espetáculos, cantor, músico, dançarino, médico, dentista, enfermeiro, veterinário, engenheiro, arquiteto, físico, químico, economista, contador, auditor, consultor, estatístico, administrador, programador, analista de sistema, advogado, psicólogo, professor, jornalista, publicitário, fisicultor, ou assemelhados, e de qualquer outra profissão cujo exercício dependa de habilitação profissional legalmente exigida;

A Lei menciona que diretor ou produtor de espetáculo, porém não conceitua o que vem a ser tal função. Segundo alega a autora, a mesma não pode ser confundida como uma produtora de espetáculo. Surge então uma dívida, qual interpretação dar para as atividades desenvolvidas pela autora? Tais atividades se enquadram ou não no rol descrito no inciso XIII do art. 9º da mencionada lei?

Ora, não se pode esquecer que na dúvida, deve-se buscar a interpretação mais favorável ao contribuinte (art. 112 do Código Tributário Nacional). Nesse ínterim, a interpretação mais favorável, no caso, é aquela que não enquadra as atividades exercidas no rol das descritas no inciso XIII do art. 9º da Lei 9.317/96. Nesse sentido, elucidando melhor o tema em questão, colhe-se o entendimento jurisprudencial firmado, recentemente, pelo Tribunal Regional Federal da 4º Região:

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REEXAME NECESSÁRIO E AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO. SIMPLES. ARTIGO 9º, XIII, DA LEI Nº 9.317/96. ORGANIZAÇÃO E PLANEJAMENTO DE EVENTOS E DE FESTAS E RECEPÇÕES. ATIVIDADES NÃO VEDADAS. ILEGITIMIDADE DA EXCLUSÃO.
1. Reexame necessário e agravo retido não conhecido, fulcro, respectivamente, na primeira parte do parágrafo segundo do artigo 475 e parágrafo primeiro do artigo 523, ambos do Código de Processo Civil.
2. O critério para aferir a impossibilidade da inclusão da empresa no SIMPLES, em todas as hipóteses do inciso XIII do art. 9º da Lei nº 9.317/96, diz respeito ao fato de a pessoa jurídica se dedicar à prestação de serviços profissionais especializados e regulamentados, que demandem, sobretudo, o preparo científico e técnico do componente humano e, por essa razão, prescindam de grandes investimentos para a sua realização.
3. As atividades de organização de eventos, bem como de festas e recepções, não se afeiçoam àquelas típicas e privativas de diretor ou produtor de espetáculos, nem necessitam de profissional com habilitação específica, exigida e regulamentada por lei, sendo vedada a aplicação analógica "in malam partem", até mesmo porque, em direito tributário, admite-se interpretação benéfica ao contribuinte.
4. As atividades não se enquadram, assim, nas hipóteses de vedação do inciso XIII do art. 9º da Lei nº 9.317/96, mostrando-se ilegítima a exclusão da empresa do SIMPLES. (TRF 4º - AC n. 2008.70.00.014085-6/PR. Rel. Otávio Roberto Pamplona.Órgão Julgador: Segunda Turma, j. 04.05.2010) grifou-se.

Nota-se nesse acórdão, que as atividades de organização de eventos não podem ser enquadradas naquelas que são típicas e privativas de diretor ou produtor de espetáculo. Consequentemente, a empresa autora faz jus ao tratamento diferenciado do SIMPLES nacional. Inclusive, fazendo uma analogia com outro julgado, pode-se afirmar que o inciso XIII do art. 9º da Lei 9.317/96 impede, que optem pelo SIMPLIES, as empresas que prestem serviços especializados de cunho intelectual e que tenham como função precípua, a produção de um espetáculo. Colhe-se trecho do referido julgado:

O aludido dispositivo impede que optem pelo Simples Nacional as pessoas jurídicas que prestem serviços especializados de cunho intelectual e tenham como instrumento precípuo, senão único, o conhecimento ou o talento de quem os realiza, essencialmente profissionais liberais, não afastando do ingresso aqueles empresários individuais ou sociedades empresárias que tenham como cerne da sua atividade econômica a produção de bens de consumo e como seu fundamento a utilização de meios de produção, tais como máquinas, ferramentas, instalações, matérias-primas, bem assim a contratação de mão-de-obra
[1].

E ainda, a respeito da interpretação da norma disposta no inciso XIII do art. 9º da Lei 9.317/96, o próprio Supremo Tribunal Federal se manifestou no sentido de que a interpretação é teleológica (aquela que busca a finalidade da norma). Oportuno se faz transcrever parte do voto proferido pelo Min. Maurício Correa proferido no julgamento da ADI nº 1.643/DF:

Não há falar-se, pois, em ofensa ao princípio da isonomia tributária, visto que a lei tributária - esse é o caráter da Lei nº 9.317/96 - pode discriminar por motivo extrafiscal entre ramos de atividade econômica, desde que a distinção seja razoável, como na hipótese vertente, derivada de uma finalidade objetiva e se aplique a todas as pessoas da mesma classe ou categoria.
A razoabilidade da Lei nº 9.317/96 consiste em beneficiar as pessoas que não possuem habilitação profissional exigida por lei, seguramente as de menor capacidade contributiva e sem estrutura bastante para atender a complexidade burocrática comum aos empresários de maior porte e aos profissionais liberais.
Essa desigualdade factual justifica tratamento desigual no âmbito tributário, em favor de mais fraco, de modo a atender também à norma contida no § 1º do art. 145 da Constituição Federal, tendo-se em vista que esse favor fiscal decorre do implemento da política fiscal e econômica, visando o interesse social. Portanto, é ato discricionário que foge ao controle do Poder Judiciário, envolvendo juízo de mera conveniência e oportunidade do Poder Executivo.

Para finalizar, oportuno mencionar também que, segundo decisão da Secretaria da Receita Federal de Curitiba, a organização de eventos, congressos não são equiparados a promoção de espetáculos. Transcreve-se Acórdão da Delegacia da Receita Federal de Curitiba/PR:

EXCLUSÃO DO SIMPLES. ORGANIZAÇÃO DE EVENTOS. ORGANIZAÇÃO DE CONGRESSOS. EQUIPARAÇÃO INADEQUADA A PROMOÇÃO DE ESPETÁCULOS. A atividade de organização de eventos, em regra, é admitida no Simples, desde que não conte com a participação de artistas, quando então configuraria a hipótese vedada de promoção de espetáculos, devendo ser permitido o ingresso de serviço de organização de congressos, a qual, apesar de ostentar natureza cultural, nada tem de artístico. EXCLUSÃO DO SIMPLES. CONTRATO SOCIAL. ATIVIDADE PERMITIDA. PRESUNÇÃO RELATIVA. ÔNUS DO FISCO. ANÚNCIO NA INTERNET. INSUFICIÊNCIA. O contrato social constituiu presunção relativa de que a empresa exerce as atividades de seu objeto social, as quais, sendo permitidas no Simples, transfere ao fisco o ônus de provar o contrário, sendo insuficiente, para tanto, o mero anúncio da empresa na Internet contendo serviços vedados, supostamente exercidos pelo contribuinte. (Delegacia da Receita Federal/Curitiba-PR, 2º Turma, Acórdão nº 06.22295, de 21.05.2009) grifou-se.

Diante disso e no caso em tela, a atividade exercida pela autora não se enquadra no rol taxativo das atividades enumeradas no inciso XIII do art. 9º da Lei 9.317/96, automaticamente, a autora faz jus as benesses do SIMPLES nacional, devendo a mesma ser enquadrada no SIMPLES como de direito.

Blumenau, 12 de agosto de 2010.

Jelson Styburski
Acadêmico de Direito

[1] TRF 4º - AP n. 2007.71.08.010549-9/RS. Rel. Marcos Roberto Araujo dos Santos.Órgão Julgador: Primeira Turma,j. 03.02.2010.

BENS DOS AUSENTES - Art. 1.159 do CPC

1 Bens dos ausentes (arts. 1.159 ao 1.169, do CPC). Conceito e objetivo.
Este capítulo refere-se aos bens dos ausentes. Este direito processual tem sua materialidade confirmada pelo Código Civil, especificamente nos arts. 22 e 23 do Diploma legal. Segundo Nestor Duarte, “caracteriza-se a ausência pela incerteza da existência de pessoa que desapareceu de seu domicílio, sem deixar notícias
[1]." Nas palavras de WAMBIER, “o procedimento estabelecido visa proteger os bens daquele que for declarado ausente, ou seja, quem desaparecer de seu domicílio sem deixar representante[2].”
1.1 Legitimação
Em regra, o juiz, a requerimento de qualquer interessado ou do Ministério Público, declarará a ausência da pessoa e nomeará curador. Já o art. 1.162, III, do CPC prevê também a sucessão provisória, quando os bens do ausente passarão para a posse dos herdeiros conforme previsão legal do art. 30 do Código Civil. A sucessão provisória será pedida pelas pessoas elencadas no §1º do art. 1.163, quais sejam:
I – o cônjuge não separado judicialmente;
II – os herdeiros presumidos legítimos e os testamentários;
III – os que tiverem sobre os bens do ausente direito subordinado à condição de morte;
IV – os credores de obrigações vencidas e não pagas.
Para o processo de habilitação do herdeiro ou do cônjuge, deve-se seguir o trâmite previsto no art. 1.057 do CPC (art. 1.167, parágrafo único, do CPC).

1.2 Competência
De acordo com a Súmula 53 do Tribunal Federal Regional – compete à Justiça Estadual processar e julgar questões pertinentes ao direito de família, ainda que estas objetivem reivindicação de benefícios previdenciários.
Para MARINONI, o STJ já decidiu diferente e o art. 78 da lei 8.213/91 contém previsão específica, desta forma, segundo o autor, “com a necessária emenda da inicial, fundamentando-se o pedido adequadamente, poderá a autora perseguir sua pretensão na esfera da Justiça Federal unicamente no tocante ao recebimento de benefícios previdenciários
[3].”
Conforme Nelson Nery Júnior, o pedido de declaração de ausência deve ser endereçado ao juiz da família (NERY JÚNIOR, 2008. p. 1.275). Inclusive, o Superior Tribunal de Justiça tem se manifestado que a declaração de ausência “deve ser declarada pela Justiça Estadual, salvo se o pedido tiver como único objetivo a percepção de benefício previdenciário mantido pela União ou autarquia. (STJ – CC n. 30.633/RJ. Rel. Min. Ari Pargendler, j. 14.02.2001).
Ainda explica o doutrinador Nelson Nery Júnior, que a sentença declaratória de ausência submete-se a registro (art. 94, LRP). Destaca-se, que ausência não se confunde com justificação para o assento do óbito. No óbito há a certeza da morte, já na ausência há a certeza do desaparecimento.

1.3 Procedimento
Em sendo declarada a ausência da pessoa, o juiz mandará arrecadar os bens desta e nomeará um curador para administrar tais bens (art. 1.160, do CPC). “Sua nomeação e funções são as mesmas do curador da herança
[4].”
Após a arrecadação doas bens, far-se-á publicação de editais durante 1 (um) ano, contado o prazo a partir da publicação do primeiro (art. 1.161, do CPC).
Se a pessoa declarada ausente retornar ao seu domicílio, obviamente, desaparece os efeitos da ausência, devendo esta ser averbada no registro público (art. 104, LRP). Entretanto, se houver certeza da morte, converte-se a sucessão provisória em definitiva. O art. 1.162, III, do CPC prevê também a sucessão provisória, quando os bens do ausente passarão para a posse dos herdeiros conforme previsão legal do art. 30 do Código Civil. A sucessão provisória será pedida pelas pessoas elencadas no §1º do art. 1.163, quais sejam:
I – o cônjuge não separado judicialmente;
II – os herdeiros presumidos legítimos e os testamentários;
III – os que tiverem sobre os bens do ausente direito subordinado à condição de morte;
IV – os credores de obrigações vencidas e não pagas.
Para o processo de habilitação do herdeiro ou do cônjuge, deve-se seguir o trâmite previsto no art. 1.057 do CPC (art. 1.167, parágrafo único, do CPC).
A sentença que determinar a abertura da sucessão provisória só terá efeito 6 (seis) meses após a publicação realizada pela imprensa (art. 1.165, do CPC).
Uma vez emitido a posse dos bens, cumpre aos herdeiros prestar caução, como uma forma de garantir a restituição dos bens, caso for necessário. Esse entendimento encontra base legal no art. 1.166 do CPC e no art. 30 do Código Civil.
Mais uma vez, se a pessoa ausente aparecer, cessa os efeitos da sucessão provisória. Porém, se houver certeza da morte, ou passados 10 (dez) anos da sentença de abertura da sucessão provisória ou ainda, quando o ausente contar com mais de 80 (oitenta) anos de idade houverem decorridos 5 (cinco) anos das últimas notícias do ausente, nestas hipóteses, a sucessão provisória converte-se e sucessão definitiva.
Após transcorridos 10 (dez) anos da sucessão definitiva, caso a pessoa ausente regresse, a mesma tem direito assegura em lei de reivindicar os bens que foram objeto da sucessão definitiva.. Ressalta-se, que não se pode confundir o prazo de 10 (dez) anos previsto no art. 1.167, II do CPC, pois, naquele, o transcurso de prazo se conta da sentença que julgou a abertura da sucessão provisória, já aqui, o prazo de 10 (dez) anos inicia-se com a abertura da sucessão definitiva.
Por fim, o parágrafo único do art. 1.169, traz que o procedimento aplicado nestes casos segue o procedimento ordinário de jurisdição contenciosa.
2 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MARINONI, Luiz Guilherme. Código de Processo Civil, comentado artigo por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 963-965.
DUARTE, Nestor. Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. 2º ed. rev. e autal. Coordenador Min. Cezar Peluso. São Paulo: Editora Manole, 2008. p. 39-48.
NERY JÚNIOR, Nelson. Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. 10º Ed. Ver., ampl. E atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 1.275-1.277.
WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: processo cautelar e procedimentos especiais. v. 3. 6º ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 311.
[1] DUARTE, Nestor. Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. 2º ed. rev. e autal. Coordenador Min. Cezar Peluso. São Paulo: Editora Manole, 2008. p. 40.

[2] WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: processo cautelar e procedimentos especiais. v. 3. 6º ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 311.
[3] MARINONI, Luiz Guilherme. Código de Processo Civil, comentado artigo por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 959.

[4] NERY JÚNIOR, Nelson. Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. 10º ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 1.276.

DAS COISAS VAGAS - ART. 1.170 DO CPC

1 Das coisas vagas (arts. 1.170 ao 1.176, do CPC).
Coisa vaga, segundo nosso direito, é a coisa perdida pelo dono e achada por outrem (arts. 1233 a 1237 e 1264 a 1266 do Código Civil de 2002).
O importante no regime da coisa vaga é que ela, embora perdida, não deixa de pertencer a seu dono, “não se extinguindo a propriedade pelo fato da perda”. Daí que “quem quer que ache coisa alheia perdida há de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor” (art. 1.233). E se não o localizar, “entregará o objeto achado à autoridade competente do lugar” (art. 1.233, parágrafo único). Uma vez restituída a coisa, tem o descobridor direito à recompensa, segundo prevê o art. 1.234 do Código Civil.
O procedimento desta entrega é disciplinado pelos arts. 1.170 a 1.176 do Código de Processo Civil, dentro dos procedimentos especiais de jurisdição voluntária.
1.1 Legitimação
O procedimento deve ser provocado por iniciativa do inventor, ou seja, da pessoa que houver achado a coisa alheia perdida (art. 1.170).

1.2 Competência
Cabe ao juiz do local em que ocorrer a invenção, isto é, a descoberta, processar o feito (art. 1.233, parágrafo único do CC/2002). Segundo Luiz Guilherme Marinoni, “outra solução está em comunicar-se o achado ao juízo de domicílio do descobridor. Seja como for, a competência é fixada em face do critério territorial e obedece ao regime da competência relativa
[1].”
1.3 Cabimento
Os bens passíveis do procedimento em exame são as coisas móveis, isto é, jóias, dinheiro, títulos de crédito, veículos etc. Até mesmo os semoventes devem ser incluídos na possibilidade da vacância e da invenção.
Explicitou, outrossim, o art. 1.175 que o procedimento é aplicável, também, “aos objetos deixados nos hotéis, oficinas e outros estabelecimentos, não sendo reclamados dentro de um mês”.
O requisito geral a ser observado, porém, em qualquer caso, é o do desconhecimento do dono do objeto achado. Pois se o inventor conhecer o proprietário, é a ela que deverá ser, diretamente, restituído o bem (art. 1.233, caput, do CC).
1.4 Procedimento
O inventor, que desconheça o dono ou possuidor da coisa achada, deverá comparecer perante a autoridade judiciária ou policial, a quem fará a respectiva entrega.
No ato da entrega, o escrivão lavrará o auto de arrecadação, do qual constarão a descrição da coisa e as declarações do inventor a respeito das circunstâncias em que a descoberta se deu (art. 1.170). A lei não diz, mas é necessário que o bem seja confiado a um depositário judicial, como é evidente.
Se a entrega se fez à autoridade policial, diligenciará esta para que o auto e o objeto sejam logo remetidos ao juiz competente (art. 1.170, parágrafo único). Se, por acaso, a polícia descobrir, antes da remessa à Justiça, quem seja o dono da coisa, esta poderá ser-lhe diretamente entregue, dando-se por encerrado o procedimento. Igual providência poderá ser adotada também quando a arrecadação tiver sido originariamente feita pela autoridade judicial.
Após o auto, o procedimento judicial consistirá na publicação de edital, por duas vezes, no órgão oficial, com intervalo de 10 (dez) dias, convocando o dono a vir reclamar a coisa depositada (art. 1.171, caput), no prazo de 60 dias. Marinoni explica que o edital serve para que o proprietário ou o legítimo possuidor reclame a coisa achada (MARINONI, 2008. p 964).
Do edital constará a descrição da coisa e das circunstâncias em que foi encontrada (art. 1.171, § 1º). Se for o caso de objeto de pequeno valor, a publicação do edital pela imprensa será dispensada e a publicidade se limitará à simples afixação do edital no átrio do edifício do fórum (art. 1.171, § 2º). Misael Montenegro Filho assim escreve:
“embora a lei tenha feito referência à coisa de pequeno valor, sem fixar critérios, entendemos que o magistrado pode aplicar a regra disposta no §3º do art. 686, para determinar a mera fixação do edital (sem publicação), quando o valor da coisa perdida não exceder o patamar de 60 (sessenta) salários mínimos
[2].”
Se o dono comparece dentro do prazo assinalado no edital e prova seu direito (a prova corresponde à condição de proprietário ou legítimo possuidor da coisa), o juiz, depois de ouvidos o órgão do Ministério Público e o representante da Fazenda Pública, efetuará a respectiva entrega mediante termo nos autos. E o processo será extinto (art. 1.172).
Pode acontecer que o dono apareça, mas não queira receber a coisa depositada, preferindo abandoná-la. Nesse caso, serão tomadas por termo suas declarações e ao inventor ficará facultado requerer a respectiva adjudicação (art. 1.174), visto que, sobre a coisa abandonada (res derelicta), a ocupação do inventor é forma de aquisição do domínio (art. 1.263 do CC).
Para MARINONI, decorridos 60 (sessenta) dias da primeira publicação e não se apresentando quem comprove a propriedade sobre a coisa, esta poderá ser vendida por iniciativa particular (art. 985-C, CPC), ou em hasta pública (arts. 686 e seguintes do CPC).
Não havendo reclamação de ninguém em torno da coisa, será ela avaliada e alienada em hasta pública. Do preço apurado, deduzir-se-ão as despesas do depósito, inclusive custas processuais, e a recompensa do inventor. O saldo pertencerá, na forma da lei, à União, ao Estado ou ao Distrito Federal (art. 1.173).
De acordo com o art. 1.237 do CC, o direito à arrecadação do saldo é do Município em cuja circunscrição se deparou o objeto perdido.
Ainda de acordo com o direito material, são direitos do inventor: a) uma recompensa não inferior a 5% do seu valor, que será arbitrada pelo juiz nos moldes de parágrafo único do art. 1.234 do CC; b) a indenização pelas despesas que houver feito com a conservação e transporte da coisa (art. 1.234 do CC). Quando se dá o abandono, o inventor pode compensar estas verbas através da adjudicação.
Rege o art. 1.175 do Código de Processo Civil, que o procedimento estabelecido no capítulo de coisas vagas, aplica-se também aos objetos deixados em hotéis, oficinas e outros estabelecimentos, se os mesmos não forem reclamados dentro do prazo de 1 (um) mês. Segundo comentário do MARINONI, os hotéis, oficinas e outros estabelecimentos possuem o dever de ter em guarda os objetos esquecidos durante 1 (um) mês.
Finalizando, prevê o art. 1.176 do CPC, que, se a coisa foi entregue à autoridade policial, pode essa desde logo instaurar inquérito policial se existir suspeita de crime. Nestes casos, compete ao juízo criminal o processamento do possível ilícito e a entrega da coisa, desde que inexista dúvida a respeito da sua propriedade ou da sua posse legítima. Ressalta-se, a subtração da coisa pode configurar o cometimento do crime previsto no inciso II do art. 169 do Código Penal – quem acha coisa alheia perdida e dela se apropria, total ou parcialmente, deixando de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor ou entregá-la à autoridade competente, dentro do prazo de 15 (quinze) dias.
2 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: Procedimentos Especiais. v. 3. 39. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 430-431.
MARINONI, Luiz Guilherme. Código de Processo Civil, comentado artigo por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 963-965.MONTENEGRO FILHO, Misael. Código de Processo Civil comentado e interpretado. 1º ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 976-977.
[1] MARINONI, Luiz Guilherme. Código de Processo Civil, comentado artigo por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 963.
[2] MONTENEGRO FILHO, Misael. Código de Processo Civil comentado e interpretado. 1º ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 976.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Resumo da matéria de introdução ao Direito Processual do Trabalho

O objetivo do texto abaixo é trazer um breve resumo para estudo direcionado a introdução ao Direito Processual do Trabalho. Este resumo prático abordará temas de forma objetiva sem aprofundar no assunto. Uma boa forma de revisar a matéria antes da prova.

Direito processual do trabalho x outros ramos do Direito.

Direito Constitucional

Segundo Sergio Pinto Martins, “a Constituição cuida da organização, constituição e composição da Justiça do Trabalho, nos arts. 111 a 116, [...][1].”
Art. 111 – São órgãos da Justiça do Trabalho:
I – o Tribunal Superior do Trabalho;
II – os Tribunais Regionais do Trabalho;
III – Juízes do Trabalho.

Art. 111.A – O Tribunal Superior do Trabalho compor-se-á de vinte e sete Ministros, escolhidos dentre brasileiros com mais de trinta e cinco anos e menos de sessenta e cinco anos, nomeados pelo Presidente da República após aprovação pela maioria absoluta do Senado Federal, sendo:
I – um quinto dentre advogados com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e membros do Ministério Público do Trabalho com mais de dez anos de efetivo exercício, observados o disposto no art. 94
[2];
II – os demais dentre juízes dos Tribunais Regionais do Trabalho, oriundos da magistratura da carreira, indicados pelo próprio Tribunal Superior.
§1º - a lei disporá sobre a competência do Tribunal Superior do Trabalho.
§2º - funcionarão junto ao Tribunal Superior do Trabalho:
I – a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho, cabendo-lhe, dentre outras funções, regulamentar os cursos oficiais para o ingresso e promoção na carreira;
II – o Conselho Superior da Justiça do Trabalho, cabendo-lhe exercer, na forma da lei, a supervisão administrativa, orçamentária, financeira e patrimonial da Justiça do Trabalho de primeiro e segundo graus, como órgão central do sistema, cujas decisões terão efeito vinculante.

Art. 112 – a lei criará varas da Justiça do Trabalho, podendo, nas comarcas não abrangidas por sua jurisdição, atribuí-la aos juízes de direito, com recurso para o respectivo Tribunal Regional do Trabalho.

Art. 113 – A lei disporá sobre a constituição, investidura, jurisdição, competência, garantias e condições de exercício dos órgãos da Justiça do Trabalho.

Art. 114 – compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:
I – as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
II – as ações que envolvem exercício do direito de greve;
III – as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores;
IV – os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição;
V – os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado o disposto no art. 102, I, “o”
[3];
VI – as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;
VII – as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho;
VIII – a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, “a” e II
[4], e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;
IX – outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei.
§1º revogado pela emenda n. 45/2004.
§2º recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente.
§3º em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, o Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho decidir o conflito.

Art. 115 – os Tribunais Regionais do Trabalho compõem-se de, no mínimo, sete juízes, recrutados, quando possível, na respectiva região, e nomeados pelo Presidente da República dentre brasileiros com mais de trinta e menos de sessenta e cinco anos, sendo:
I – um quinto dentre advogados com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e membros do Ministério Público do Trabalho com mais de dez anos de efetivo exercício, observado o disposto no art. 94;
II – os demais, mediante promoção de juízes do trabalho por antigüidade e merecimento, alternadamente.
§ 1º Os Tribunais Regionais do Trabalho instalarão a justiça itinerante, com a realização de audiências e demais funções de atividade jurisdicional, nos limites territoriais da respectiva jurisdição, servindo-se de equipamentos públicos e comunitários.
§ 2º Os Tribunais Regionais do Trabalho poderão funcionar descentralizadamente, constituindo Câmaras regionais, a fim de assegurar o pleno acesso do jurisdicionado à justiça em todas as fases do processo.

Art. 116 - nas Varas do Trabalho, a jurisdição será exercida por um juiz singular.


Direito do trabalho

Basicamente o Direito do trabalho traz o direito material para que o direito processual do trabalho assegure e concretize as normas contidas neste direito.

Direito Processual

Segundo Sérgio Pinto Martins, o direito processual comum é o gênero e o direito processual do trabalho é espécie[5]. Na omissão da CLT, aplicam-se as regras do CPC.
Art. 769 da CLT – nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.
Título X – DO PROCESSO JUDICIÁRIO DO TRABALHO.


Direito administrativo

O Direito Processual do Trabalho se relaciona ao Direito Administrativo quanto à organização da própria Justiça do Trabalho e do regime jurídico de seus servidores.

Direito Penal

Em regra, o Direito Processual do Trabalho tem enlace com o Direito Penal ao tratar das questões de despedidas por justa causa (art. 482 da CLT), pois em muito se assemelham com as infrações penais.

Direito privado

Algumas normas previstas no Direito Civil e no Direito Comercial são também aplicadas no processo do trabalho, especialmente a falências e recuperações judiciais de empresas, habilitação de herdeiros, conceitos de parentescos e etc.

Direito Tributário

O Direito Processual do Trabalho se relaciona quando é utilizada a Lei n. 6.830/80 (lei de execuções fiscais). Tal previsão é possível observar no art. 889 da CLT.
Art. 889 – aos trâmites e incidentes do processo da execução são aplicáveis, naquilo em que não contravierem ao presente Título, os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal.


Fontes do Direito Processual do Trabalho

Segundo Josyane Nazareth de Souza, “as fontes do Direito Processual do Trabalho são materiais e formais[6].” As fontes materiais emergem do próprio direito material do trabalho. Já as fontes as fontes formais dividem-se em formais diretas, formais indiretas e de explicação.
As fontes formais diretas provêm da lei e os costumes. As fontes formais indiretas são extraídas da doutrina e da jurisprudência. Também há na doutrina as fontes formais de explicação tais como, a analogia, os princípios gerais do direito e a equidade.


Singularidades do Direito Processual do Trabalho

Aqui será destacado, através da brilhante obra já mencionada, algumas características peculiares do Direito Processual do Trabalho que, na sua essência, difere do Direito Processual Civil.
“a) Autonomia – [...], existência da autonomia em razão de seguir lei especial, em órgão jurisdicional especial;
b) Instituição própria – as decisões normativas não apresentam similares no processo comum;
c) Conciliação – [...], o juiz do trabalho, antes de julgador, é conciliador. Somente depois de esgotada a possibilidade de conciliação, vem à tona a atividade julgadora
[7];
d) Gratuidade da Justiça – é gratuita a justiça para o trabalhador cujo salário mensal seja igual ou superior ao dobro do salário mínimo, sendo facultado ao juiz deferir ex officio o benefício, [...];
e) Oralidade – a forte presença da oralidade constitui uma especialidade do processo do trabalho, [...];
f) Representação classista – com a Emenda Constitucional n. 24/99, a jurisdição passou então a ser exercida por juiz singular;
g) Sentença normativa – o juiz do trabalho tem o poder de estatuir normas e condições de trabalho, de forma abstrata e de cumprimento obrigatório;
h) Procedimento sumaríssimo – as reclamações individuais, de valor não superior a 40 salários mínimos, ficam sujeitas ao procedimento sumaríssimo, [...]
[8].”
Importante destacar que essas singularidades se encontram na referida obra que de forma prática e resumida frisou tais pontos mencionados. Também destacam-se que nesta mesma obra, citando Amador Paes de Almeida
[9], a doutrinadora elenca dois requisitos para aplicação subsidiária do processo civil:
“a) a omissão da legislação processual trabalhista; b) compatibilidade da norma processual civil subsidiária com os princípios do processo do trabalho
[10].”

Da ação trabalhista

Elementos da ação
a) as partes ou sujeitos – são as pessoas da ação que figuram nos pólos ativo (reclamante) e passivo (reclamado) da relação jurídica processual.
b) o pedido ou objeto – é o elemento objetivo da ação, seu objeto, o que se requer com a ação.
c) causa de pedir – são os motivos fáticos e jurídicos que justificam a invocação da tutela jurisdicional. Segundo Sérgio Pinto Martins, “pressupõe a existência de um direito material assegurado ao autor, o qual gerou a pretensão resistida. A causa de pedir vai ser a base para o pedido, [...]
[11].”

Condições da ação

a) a possibilidade jurídica do pedido – o pedido do reclamante precisa estar amparado em norma de direito material, ou seja, a pretensão deduzida precisa estar prevista na lei que rege o direito do trabalho.
b) interesse de agir – é o interesse processual da parte em buscar no Poder Judiciário o reconhecimento do seu direito. Josyane Nazareth de Souza escreve que o interesse processual emerge do trinômio necessidade-utilidade-adequação
[12].
c) legitimidade da parte ou ad causam – é a titularidade que identifica a pessoa do reclamante ou reclamado, pois a ação deve ser ajuizada por quem é titular do direito material.


Ocorrendo ausência de algum ou algumas dessas condições, haverá carência de ação, gerando coisa julgada formal, sem se analisar o mérito. Essa carência é examinada de ofício pelo magistrado, mas pode também ser argüida pela defesa.

Pressupostos da existência do processo

a) jurisdição – o órgão a quem é dirigida a ação deve estar investido do poder de processar e julgar o conflito. Poder de julgar.
b) pedido – o processo inicia-se com a provocação do Estado mediante um pedido, ou seja, requerimento de ver um direito atendido pelo Poder Judiciário, representante legítimo do Estado.
c) partes – são as pessoas, reclamante e reclamado, envolvidas nas pretensões que se encontram em conflito.


Pressupostos de validade do processo

Na ilustre obra de Sérgio Pinto Martins, encontram-se os seguintes pressupostos de validade do processo:
a) competência – está relacionada com a jurisdição, ou seja, quem possui competência para julgar determinada reclamação trabalhista.
b) insuspeição – o juiz não pode ser declarado suspeito para julgar determinada ação devido ao princípio da imparcialidade.
c) inexistência de coisa julgada – o juiz não deve se manifestar em relação a matéria já julgada em processo anterior que envolve as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.

d) inexistência de litispendência – se uma mesma ação já está sendo processada e julgada em outro juízo competente, não é possível que seja ingressado com uma segunda ação, devendo esta ser julgada extinta sem julgamento do mérito devido a existência de litispendência.
e) capacidade processual dos litigantes – para propositura da reclamação trabalhista as partes devem ser capazes, ou seja, serem maiores de 18 anos
[13]. Os menores de 18 anos devem ser assistidos pelos pais ou pela Procuradoria do Trabalho[14].
f) regularidade da petição inicial – a petição inicial deverá atender aos requisitos estipulados na lei, art. 840, §§1º e 2º da CLT
[15], bem como as disposições do art. 282 do CPC[16].
g) regularidade da citação – para o prosseguimento da reclamação trabalhista é imprescindível que ocorra a regular citação do reclamado.
h) pressupostos objetivos – está relacionada com o pedido dirigido ao juiz, a citação do reclamado, inexistência de litispendência e coisa julgada.
i) pressupostos subjetivos – estão relacionados a jurisdição, competência e imparcialidade, capacidade para ser parte, de estar em juízo.

Princípios Constitucionais aplicáveis ao Direito Processual do Trabalho

Da brilhante obra[17] da doutrinadora Josyane Nazareth de Souza se extrai os seguintes princípios:
a) princípio da igualdade – “todos são iguais perante a lei [...].” (art. 5º da CF/88). Igualdade de tratamento = igualdade formal; igualdade de condições = igualdade material.
b) princípio do contraditório e da ampla defesa – é o direito das partes de poderem apresentar suas versões sobre os fatos, bem como de realizar provas de suas alegações.
c) princípio da imparcialidade do juiz – o juiz deve tratar com equidade as partes envolvidas, sendo imparcial na tomada de decisões.
d) princípio da motivação das decisões – todas as decisões dos julgamentos precisam estar fundamentadas. A não fundamentação gera nulidade da sentença conforme previsão constitucional do art. 93º, IX.
e) princípio do devido processo legal – previsão contida no art. 5º, LIV da CF/88, que determina que ninguém será privado da liberdade de seus bens sem o devido processo legal, ou seja, o processo precisa seguir procedimento de lei.
f) princípio do juiz e do promotor natural – também está previsto no art. 5º, XXXVII da CF/88 que determina que não haverá tribunal de exceção e que ninguém será processado e julgado senão pela autoridade competente. É o poder de jurisdição.
g) princípio do duplo grau de jurisdição – é o direito de ver seu pleito submetido a nova apreciação em grau recursal.
h) princípio da ação ou da livre iniciativa – quem movimenta toda a máquina do judiciário é a parte interessada, sendo vedada a manifestação de ofício pelo Juiz-Estado, salvo nos casos previstos em lei.
i) princípio do dispositivo e inquisitório – é o poder conferido às partes para dispor do processo, trazendo pontos controvertidos, inquirindo testemunhas e exigindo a produção de provas.
j) princípio da oralidade – diante do objetivo da celeridade, este princípio visa que o processo seja oral, adotando a forma escrita apenas de forma subsidiária.
k) princípio da instrumentalidade das formas – os atos e formas processuais não dependem de forma específica, salvo aquelas que a lei exigir. Por isso, determinados atos são válidos, mesmo que não observada a forma do ato.
l) princípio da lealdade processual e da boa-fé – todas as partes envolvidas no processo devem agir com respeito, urbanidade, lealdade e boa-fé uns com os outros na condução do processo.
m) princípio da fungibilidade – pode ser admitido determinado ato em lugar de outro.
n) princípio da economia processual – devem ser repudiados no processo atos meramente protelatórios visando uma solução rápida e com o mínimo de despesas.
o) princípio da eventualidade e preclusão – o processo se desenvolve de forma lógica e em determinado tempo ou prazo legal.
p) princípio da publicidade – o processo deve ser público, exceto nos casos onde há segredo de justiça.

Princípios singulares do direito processual do trabalho

Alguns destes princípios são os mesmos do Processo Civil, outros são próprios do Direito Processual do Trabalho. A obra[18] já mencionada traz os seguintes princípios singulares:
a) princípio da irrenunciabilidade – as normas trabalhistas são imperativas e, na sua maioria, de ordem pública, sendo que os direitos trabalhistas compõem um estatuto mínimo que as partes não podem transigir. O trabalhador não pode renunciar o direito previsto na CLT ou em leis do trabalho esparsas.
b) princípio do in dúbio pro operário – o direito processual do trabalho precisa ter natureza protecionista, ou seja, proteger a parte mais fraca da relação, que já é cristalino que essa parte mais fraca é o empregado. Na dúvida, que seja favorável ao operário.
c) princípio da primazia da realidade – assim como no direito material o direito processual do trabalho deve buscar a realidade dos fatos.
d) princípio da jurisdição normativa – o Judiciário Trabalhista tem poder para se utilizar da via processual para criar ou modificar condições de trabalho nos dissídios coletivos.
e) princípio do jus postulandi – as partes podem litigar pessoalmente sem precisar de advogado.
f) princípio da coletivização das ações individuais – visa atender a economia processual, pois diversas ações idênticas podem ser postuladas por um sindicato que represente determinada categoria de trabalhadores.
g) princípio da irrecorribilidade das decisões interlocutórias – visa impedir, tanto quanto possível, interrupções que prejudiquem a celeridade processual, desta forma as decisões que não sejam terminativas não são recorríveis.
h) princípio da iniciativa extraparte – consiste na iniciativa ex officio da ação, como por exemplo, a ação de anotação do contrato na carteira de trabalho, segundo prevê o art. 39 da CLT.
i) princípio da concentração – toda a instrução do processo trabalhista deve procurar resumir-se a um número mínimo de audiências.
j) princípio da celeridade – todas as partes envolvidas no processo devem buscar agir de modo a chegar rapidamente ao deslinde da controvérsia.


Referências

[1] MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual do Trabalho: doutrina e prática forense. 29 ed. São Paulo: Atlas, 2009. p 26.

[2] Art. 94 da CF/88 – um quinto dos lugares dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais dos Estados, e do Distrito Federal e Territórios serão compostos de membros, do Ministério Público, com mais de dez anos de carreira, e de advogados de notório saber jurídico e de reputação ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes.

[3] Art. 102, I, “o” da CF/88 – Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I – processar e julga, originariamente:
o) os conflitos de competência entre o Superior Tribunal de Justiça e quaisquer tribunais, entre Tribunais Superiores, ou entre estes e qualquer outro tribunal;

[4] Art. 195, I, “a” e II da CF/88 – A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidente sobre:
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou credenciados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;
II – do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201;


[5] MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual do Trabalho: doutrina e prática forense. 29 ed. São Paulo: Atlas, 2009. p 27.

[6] SOUZA, Josyane Nazareth de. Direito processual do trabalho. São Paulo: Saraiva, 2010. p 20.

[7] Art. 846 da CLT – aberta a audiência, o juiz ou presidente proporá a conciliação.

[8] SOUZA, Josyane Nazareth de. Direito processual do trabalho. São Paulo: Saraiva, 2010. p 17 – 19.

[9] ALMEIDA, Amador Paes. CLT comentada. São Paulo: Saraiva, 2002. p 361.

[10] SOUZA, Josyane Nazareth de. Direito processual do trabalho. São Paulo: Saraiva, 2010. p 19.

[11] MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual do Trabalho: doutrina e prática forense. 29 ed. São Paulo: Atlas, 2009. p 225 – 226.

[12] SOUZA, Josyane Nazareth de. Direito processual do trabalho. São Paulo: Saraiva, 2010. p 64.

[13] Art. 792 da CLT – Os maiores de 18 (dezoito) e menores de 21 (vinte e um) anos e as mulheres casadas poderão pleitear perante a Justiça do Trabalho sem assistência de seus pais, tutores ou maridos.

[14] Art. 793 da CLT – A reclamação trabalhista do menor de 18 (dezoito) anos será feita por seus representantes legais e, na falta destes, pela Procuradoria da Justiça do Trabalho, pelo sindicato ou curador nomeado em juízo.

[15] Art. 840 da CLT – A reclamação poderá ser escrita ou verbal.
§ 1º - Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do Presidente da Junta, ou do juiz de direito a quem for dirigida, a qualificação do reclamante e do reclamado, uma breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante.
§ 2º - Se verbal, a reclamação será reduzida a termo, em 2 (duas) vias datadas e assinadas pelo escrivão ou secretário, observado, no que couber, o disposto no parágrafo anterior.

[16] Art. 282do CPC. A petição inicial indicará:
I - o juiz ou tribunal, a que é dirigida;
II - os nomes, prenomes, estado civil, profissão, domicílio e residência do autor e do réu;
III - o fato e os fundamentos jurídicos do pedido;
IV - o pedido, com as suas especificações;
V - o valor da causa;
VI - as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados;
VII - o requerimento para a citação do réu.

[17] SOUZA, Josyane Nazareth de. Direito processual do trabalho. São Paulo: Saraiva, 2010. p 22 - 25.

[18] SOUZA, Josyane Nazareth de. Direito processual do trabalho. São Paulo: Saraiva, 2010. p 25 - 27.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

PARECER TÉCNICO JURÍDICO
RESPONSABILIDADE CIVIL. CONDOMÍNIO EDILÍCIO. OBRIGAÇÃO DE PAGAR DESPESA EXTRAORDINÁRIA. SETENÇA CONDENATÓRIA TRANSITADA EM JULGADO. DEVER DO CONDÔMINO ATUAL DE CONTRIBUIR.
1. Analisando, especificamente, o relato dos fatos trazidos, tem-se que, é dever do condômino atual contribuir com as despesas extraordinárias impostas ao condomínio. Aplicação do art. 1.336, I, e art. 1.345, ambos do Código Civil combinado com art. 12 da Lei n. 4.591/64.
2. Caberá ação de regresso se provado a má-fé do antigo vendedor ou se houver previsão expressa no contrato de compra e venda. Pode-se também, comprovar existência de vícios redibitórios.


Relatório

Conforme relato, em março de 2009 o Sr. José Soró, casado com Eli Soró, adquiriu do Sr. João Doti, um imóvel em condomínio edilício, e este já havia adquirido, em 2008, de Pedro Sortre, que adquiriu da Construtora Maruza Ltda, em 2003. Em 2004 houve um incidente no condomínio com o funcionário da segurança, onde este disparou arma de fogo, vitimando Lúcio Joly, que veio a óbito. Agora em 2010 o Condomínio foi condenado em uma indenização no valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) em favor da família da vítima.
Dito isso, o consulente pergunta:
I – quem arcará com a indenização?
II – poderá o Sr. José Soró intentar ação de regresso em face do proprietário da unidade em condomínio edilício ao tempo do fato que ensejou a indenizatória?
Diante do exposto, sem analisar documentos da relação e sem observar maiores detalhes, passa-se à exposição do parecer:

I - Nota-se, no caso em tela, tratar-se de despesa de condomínio firmada em 2010 por sentença condenatória transitada em julgado. Tal sentença condenou o condomínio a pagar uma indenização referente ao delito ocorrido no ano de 2004. Não se busca aqui verificar a data do ilícito penal, mas sim, quem arcará com esta despesa extraordinária fixada através de sentença, que provavelmente, analisou o mérito da responsabilidade do ilícito penal. Aqui é nítido que a despesa se fixou em 2010 e será rateada em conformidade com a quota-parte de cada condômino atual.
Prevê claramente o art. 1.336, I, do Código Civil, in verbis:

Art. 1.336 - São deveres do condômino:
I – contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção.
Art. 1.345 – O adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive multas e juros.

Dispositivo este encontrado também no art. 12 da Lei especial 4.591/64:

Art. 12 - Cada condômino concorrerá nas despesas do condomínio, recolhendo, nos prazos previstos na Convenção, a quota-parte que lhe couber em rateio.

É o primeiro dever do condômino pagar pelas despesas por meio da contribuição condominial que será recolhida na proporção da quota-parte e de acordo com previsão da convenção do condomínio.

Trata-se aqui de obrigação real de natureza propter rem que passa a pesar sobre quem é o titular do imóvel. A doutrina ensina que,
“ao adquirir uma unidade condominial, cabe ao comprador a responsabilidade de saldar os débitos da unidade que comprou, se existirem, uma vez que o vínculo se estabelece não com uma pessoa determinada, mas com quem quer que seja titular daquele direito real[1].”
E ainda,

“obrigação propter rem é a que recai sobre uma pessoa, por força de determinado direito real. Só existe em razão da situação jurídica do obrigado, titular do domínio ou de detentor de determinada coisa[2].” Logo, “o adquirente responderá por obrigação propter rem, que se liga ao titular do imóvel ainda que seja promitente comprador[3].”
Nesse Sentido, o Superior Tribunal de Justiça tem entendido que “as cotas condominiais, [...], situam-se como obrigações propter rem, ou seja, obrigações reais, que passam a pesar sobre quem é o titular da coisa; se o direito real que a origina é transmitido, as obrigações o seguem, de modo que nada obsta que se volte a ação de cobrança dos encargos condominiais contra os proprietários[4].” Grifou-se.
Colhe-se entendimento de julgado:

DIREITO CIVIL. DESPESAS DE CONDOMÍNIO. PROMITENTE VENDEDOR. TRANSMISSÃO DA POSSE ANTERIOR AO PERÍODO DA DÍVIDA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. RECURSO PROVIDO. I - O promitente comprador é parte legítima para responder pelas despesas condominiais se a dívida se refere a período posterior à celebração do contrato de promessa de compra e venda, ainda que não registrado, havendo legitimidade do promitente vendedor somente se o débito cobrado se referir a data anterior à do contrato. II - Tendo o promitente vendedor transferido a posse dos imóveis em data anterior ao período da dívida, mediante compromisso de compra e venda, não detém ele legitimidade para responder à ação de cobrança das despesas de condomínio. (STJ - REsp. 258382. Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira. Órgão Julgador: Quarta Turma, DJ 25.09.2007). Grifou-se.

In casu, como não está mencionada a existência de contrato de compra e venda, cabe ao atual possuidor do imóvel contribuir com esta despesa extraordinária que só veio a se confirmar em 2010.

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina, em julgamento da apelação cível n. 1999.005700-3, entendeu que o dever de pagar as cotas condominiais é obrigação real, intimamente ligada à qualidade de proprietário. A Ementa desse julgamento traz AÇÃO DE COBRANÇA. COTAS CONDOMINIAIS RELATIVAS AO PERÍODO ANTERIOR À AQUISIÇÃO DO IMÓVEL. RESPONSABILIDADE DO ATUAL PROPRIETÁRIO. RECURSO DESPROVIDO[5]. Grifou-se.

Mesmo que, no caso sob análise não se busca questionar cotas atrasadas, tais fundamentos descritos visam concretizar a idéia do dever inerente ao condômino de contribuir para com a despesa extraordinária fixada em 2010, período em que o consulente é possuidor do referido imóvel e, está no direito de usar, fruir e dispor de sua unidade condominial.

Para melhor compreensão, transcreve texto de Francisco Eduardo Loureiro ao comentar o dispositivo do art. 1.345 do Código Civil, texto este, redigido sob a coordenadoria do Ministro César Peluso:

“Pense-se na hipótese de uma repetição de indébito ajuizada pelo condomínio, ou uma ação de reparação de danos por vício de construção contra a construtora, por fato anterior, cujo pagamento, porém, seja feito em data posterior à alienação. A interpretação deve ser simétrica, transferindo o alienante ao adquirente todos os direitos incidentes sobre a coisa, salvo convenção em sentido contrário[6].” Grifou-se.

Fazendo uma analogia ao caso relatado e ao comentário transcrito acima, mesmo que o ilícito penal tenha ocorrido em data anterior a transferência do imóvel, gerando um despesa extraordinária que será paga em data posterior, essa obrigação de contribuir cabe ao condômino atual que adquiriu todos os direitos e deveres sobre a coisa.

Com isso, respondendo ao primeiro questionamento, essa despesa extraordinária, imposta em 2010 ao condomínio, será rateada entre todos os condôminos atuais através da contribuição quota-parte atribuível a cada unidade no sentido de garantir o equilíbrio econômico e financeiro do todo.

II - Em relação ao segundo questionamento, sobre o direito de regresso, a legislação do condomínio edilício é omissa. Aplicando-se subsidiariamente o disposto no art. 1.318 do Código Civil (que trata do condomínio em geral), cabe ação de regresso, quando o novo adquirente pagar débitos anteriores. Ora, indaga-se: existia débitos/despesas antes de março de 2009 (momento em que o consulente adquiriu o imóvel)?

Do relato trazido, não se verifica a existência de despesas anteriores ao momento em que ocorreu a transferência do imóvel para o consulente. Sendo assim, não caberá ação regressiva.

Indaga-se ainda: em que momento se caracterizou o débito/despesa para o condomínio?
Dos fatos, é notório que o surgimento da despesa extraordinária se concretizou com a sentença condenatória em face do condomínio transitada em julgado somente em 2010.

Buscando chegar a uma conclusão coesa, utiliza-se, no caso, hipóteses que poderão ser previstas. Observa-se:

Primeira hipótese prevista no art. 934 do Código Civil:

Art. 934 – Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente incapaz.

Ora, no caso, os antigos condôminos que transferiram o imóvel não foram responsáveis pelo dano causado, pois a conduta fora pratica por funcionário do condomínio. Conduta esta, que somente agora em 2010 foi responsabilizada e apurada.

É óbvio que, se comprovar que a transferência do imóvel se deu de forma irregular ou eivada de má-fé[7] dos proprietários, poderá o novo adquirente obter sucesso em ação regressiva contra os condôminos anteriores. Repita-se, o parecer técnico elaborado está restrito as informações dos relatos colhidos.

A doutrina explica que o comprador poderá mover ação regressiva contra vendedor quando se referir sobre débitos anteriores. Transcreve-se: “o comprador pode agir regressivamente em face do vendedor, com fundamento no vertente dispositivo, em razão de débitos anteriores que é obrigado a suportar em razão de sua propriedade ou de ser titular do bem[8].” Comentário feito pela doutrina ao discorrer sobre o art. 502[9] do Código Civil. Desta forma, para melhor orientar o consulente, faz-se necessário analisar as cláusulas contratuais do respectivo contrato de compra e venda.

A segunda hipótese é encontrada no art. 441 do Código Civil:

Art. 441 – A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor.

Caso não seja possível ter acesso ao contrato de compra e venda, e, ficar difícil de provar que houve má-fé dos antigos condôminos, pode-se ingressar com ação de regresso utilizando como fundamento, vícios redibitórios, ou seja, que o imóvel fora adquirido com vício oculto, acarretando prejuízo ao novo adquirente. Com isso remanesce a responsabilidade do alienante pelo vício pré-existente. Dispõem o Código Civil ainda:
Art. 444 – A responsabilidade do alienante subsiste ainda que a coisa pereça em poder do alienatário, se perecer por vício oculto, já existente ao tempo da tradição.

E mais, se provar que os condôminos conheciam do vício deixando de informar ao novo adquirente, estes poderão restituir os valores pagos mais perdas e danos. Se, no momento da transferência, ficar provado que desconheciam, poderão restituir o valor recebido pela venda do imóvel
[10].

Conclusão

Diante disso, analisando somente o relato, conclui-se que José Soro tem o dever e obrigação de contribuir com a despesa extraordinária incumbida ao condomínio em 2010. Ao que se refere sobre o direito de regresso, necessário se faz, colher maiores detalhes para, dependendo da realidade, orientar o melhor caminho para propositura de tal ação.

Este é o parecer.


Blumenau, 25.02.2010

Jelson Styburski


[1] FIUZA, Ricardo. Código Civil comentado. 5 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009. p 1434.
[2] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: teoria geral das obrigações. v II. 5 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p 11.
[3] FILHO, Lair da Silva Loureiro e SCAVONE JR, Luiz Antonio. Comentários ao código civil: artigo por artigo. 2 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p 1.345.
[4] REsp. 846187/SP. Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa. Órgão Julgador: Quarta Turma, DJ 09.04.2007.
[5] Apelação Cível n. 1999.005700-3, de São José. Rel. Carlos Prudêncio. Órgão Julgador: Primeira Turma, j 27.03.2001.
[6] LOUREIRO, Francisco Eduardo. Coordenador: Min. César Peluso. Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. 2 ed. rev. e atual. Barueri, SP: Manole, 2008. p 1334.
[7] Art. 422 do CC – Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em seua execução, os princípios de probidade e boa-fé.
[8] GALIZA, Cássio e SCAVONE JR, Luiz Antonio. Comentários ao código civil: artigo por artigo. 2 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p 847 - 848.
[9] Art. 502 do CC – O vendedor, salvo convenção em contrário, responde por todos os débitos que gravem a coisa até o momento da tradição.
[10] Art. 443 do CC – Se o alienante conhecia o vício ou defeito da coisa, restituirá o que recebeu com perdas e danos; se o não conhecia, tão somente restituirá o valor recebido, mais as despesas do contrato.